“Ao invés de lucro, temos que produzir alimentos”, diz João Pedro Stedile
Por Bruno Pavan e Vivian Fernandes, Brasil de Fato
O membro da direção nacional do Movimento dos trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) João Pedro Stedile reforçou, na 1a Feira Nacional da Reforma Agrária, no Parque da Água Branca, em São Paulo, que os camponeses precisam oferecer um novo modelo de agricultura para o Brasil.
“A sociedade brasileira enfrenta uma disputa entre dois modelos de agricultura. Um deles é o das transnacionais, que é baseado na produção de commodities e no uso de veneno. O outro é o projeto dos trabalhadores, que significa organizar a agricultura pra produzir alimentos sadios para a população local. Ao invés de lucro temos que produzir alimentos”, explicou.
Stedile contou que a visão sobre reforma agrária, até mesmo dentro do movimento mudou, e que hoje o MST precisa dialogar também com os moradores das grandes metrópoles para que eles percebam o quanto são prejudicados com o consumo de alimentos com o uso excessivo de agrotóxico.
“A população da cidade é que vai desequilibrar essa luta, quando chegar no supermercado e falar ‘não quero mais óleo de soja transgênico, quando disser não quero mais tomate com veneno porque o câncer vai ficar pra mim e não com o dono do supermercado’. Essa conscientização vai nos ajudar pra que o governo se convença que é preciso construir uma nova agricultura e abandonar essa ilusão do agronegócio”, critica.
O integrante da Campanha contra o uso de Agrotóxicos e pela Vida, Luís Carlos Meireles, criticou a influência econômica do agronegócio sobre a política. «É preciso fortalecer o posicionamento contrário à ida da Anvisa para o Ministério da Agricultura», apontou. A medida, segundo ele, tornaria a fiscalização e regulamentação dos agrotóxicos ainda mais difícil.
Patrus Ananias, ministro do Desenvolvimento Agrário, apontou para os desafios postos em relação à questão agrária e a necessidade de revisão do modelo de desenvolvimento no qual a sociedade se baseia. “Vivemos, hoje, uma crise que não é só no Brasil, é uma crise mundial e cósmica que diz respeito ao clima, a água e a terra. Temos que propor coisas novas e não permitir que o dinheiro e o lucro definam a nossa vida e futuro», afirmou.
“Adorei! Achei bom demais! E vamos ficar esperando a próxima”, afirmou a alegre Cleide de Oliveira Ribeiro, de Corumbá de Goiás, no estado goiano. Ela, junto com outros quase 700 feirantes estiveram expondo e vendendo seus produtos na feira, que contou com um público de 150 mil pessoas, segundo os organizadores.
Para Cleide, “a feira foi maravilhosa e o recado que a gente queria passar com essa feira, foi passado”, que completou dizendo que foi uma oportunidade dela conhecer São Paulo: “Primeira vez aqui, e, por mim, eu voltava amanhã de novo”. Ela vendeu doces e compotas diversas em sua barraca, como de caju, manga e outros sabores do Cerrado brasileiro.
Voltar em breve também é a expectativa de Julinda de Oliveira Lopes, do município de Andradina, interior paulista, que vendia artesanato de cabaça e sementes, além de vassoura, bucha vegetal, cebola e açafrão. “Seria muito bom se tivesse a cada seis meses essa feira. Para nós é muito importante para a gente escoar toda a nossa mercadoria produzida lá, porque não tem uma feira como essa lá”, opinou.
A boa recepção do público paulistano também foi comemorada pelos produtores sem-terra. “O povo paulista demonstrou para nós um grande interesse na produção agroecológica e orgânica dos assentamentos de reforma agrária”, contou Davi Montenegro, do assentamento Paulo Jackson, do município de Ibirapitanga, sul da Bahia.
“Mostramos que a produção orgânica não tem um custo elevado. O que acontece é que as empresas buscam aproveitar um nicho de mercado para praticar preços fora da realidade. Enquanto que os camponeses podem produzir alimentos saudáveis a preços populares, e que suprem a demanda da cidade. Então, a feira cumpriu esse papel de uma grande troca entre o povo brasileiro, em que a gente pode mostrar toda a nossa cultura, a arte e a música. Foi uma grande festa do povo brasileiro”, afirmou Davi.
Ao todo, foram 220 toneladas de alimentos comercializados na 1a Feira Nacional da Reforma Agrária, com uma estimativa de cerca de R$ 2 milhões de arrecadação, apontou um dos coordenadores do setor de produção do MST, Adalberto de Oliveira, que atua na frente de comercialização e é assentado em Itapeva, interior de São Paulo. Na feira estiveram mais de 700 acampados e assentados da reforma agrária, que trouxeram 600 variedades de produtos, de 23 estados e do Distrito Federal.
Além da população de São Paulo, passaram pelo evento políticos como o ex-presidente Lula, o ministro de Desenvolvimento Agrário Patrus Ananias, o secretário de Cultura da cidade de São Paulo, Eduardo Suplicy, o deputado federal Ivan Valente, a cantora Karina Buhr, o ex-jogador de futebol Raí, também os cantores Chico César e Zé Geraldo, que fizeram execelntes shows no encerramento do sábado e domingo da Feira.
Fotos: Gerhard Dilger