Encontro de Povos e Comunidades do Cerrado emitiu moção contra a iminente aprovação da exploração de gás de xisto no país; organizações técnicas e profissionais e movimentos também demonstram a mesma preocupação em carta à presidente.
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Moção de Repúdio à exploração de gás de xisto e ao uso da fratura hidráulica e em defesa do Cerrado
Nós, povos (indígenas, retireiros/as, assentados/as, quilombolas, fechos de pasto, ribeirinhos/as) do cerrado da Bahia, de Mina s Gerais, de Rondônia, de Goiás, do Maranhão, do Piauí, do Mato Grosso, do Mato Grosso do Sul e São Paulo, agentes da Comissão Pastoral da Terra e do Conselho Indigenista Missionário, religiosos/as, professores/as universitários/as, da Rede Cerrado, do Movimento dos Atingidos por Barragens, da Rede Grita Cerrado, da Agência 10envolvimento e profissionais da área técnica, reunidos em Luziânia (GO), entre 22 e 24 de novembro de 2013, no encontro intitulado «No veio das águas brota a vida, dos troncos retorcidos surge a esperança”, onde nos encontramos para discutir a intensa degradação ambiental do bioma Cerrado e as nossas resistências e meios de preservação, vimos por meio dessa Moção manifestar a nossa indignação e perplexidade ante a mais uma forma de degradação ambiental em curso.
O bioma Cerrado, tão intensamente devastado pelo agronegócio, através do desmatamento da vegetação nativa, do uso de agrotóxicos, da contaminação do solo e dos corpos hídricos, nesse momento é alvo de mais uma investida que trará impactos socioambientais de proporções gigantescas.
Trata-se da exploração de gás de xisto, que tem como método a chamada fratura hidráulica.
A fratura hidráulica, em resumo, consiste em injetar enormes quantidades de água e componentes químicos altamente poluentes no subsolo para a extração do gás, com a finalidade de fraturar as rochas em que ele se encontra. Esses poluentes químicos migram para as águas subterrâneas, e, conforme já se posicionaram inúmeros cientistas, a exemplo da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Ciência, não há estudos sobre o controle e mitigação de impactos socioambientais gerados pela fratura hidráulica e sobre a despoluição das águas contaminadas pelos metais pesados, o que torna essa contaminação irreversível.
A exploração de gás de xisto por meio da fratura hidráulica tem sido banida em diversos países do mundo, como França e Uruguai. No entanto, o governo brasileiro, sem comunicar a população dessa catástrofe ambiental, irá realizar nos dias 28 e 29 de novembro de 2013, a 12ª Rodada dos Leilões da Agência Nacional de Petróleo. Serão leiloados duzentos e quarenta blocos territoriais no Acre, Amazonas, Piauí, Maranhão, Goiás, Tocantins, Sergipe, Alagoas, Bahia, Mato Grosso, Paraná e São Paulo. Nessas regiões em que estão blocos e que serão objeto de fratura hidráulica, sabemos que se encontram os principais aquíferos, Bambui, Urucuia, Guarani, que alimentam os rios brasileiros e suas bacias. O que dá ao impacto ambiental gerado pela fratura hidráulica um caráter nacional e até continental.
Em defesa do cerrado, dos aquíferos brasileiros, sobretudo o Urucuia, dos nossos territórios tradicionais, e dos nossos modos de vida, nos posicionamos contra a realização da 12ª Rodada de Leilões da ANP, contra o uso da fratura hidráulica e exploração de gás de xisto, contra mais essa forma nefasta de devastação de bioma que estamos tentando manter em pé.
Participantes do Encontro de Povos e Comunidades do Cerrado
Luziânia, 24 de novembro de 2013.
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Brasília, 23 de novembro de 2013.
Carta aberta à Excelentíssima Senhora Presidenta DILMA VANA ROUSSEFF
Excelentíssima Senhora Presidenta
As organizações técnicas e profissionais que subscrevem essa carta solicitam que seja imediatamente retirado do Edital da 12ª. Rodada de Licitações da Agência Nacional do Petróleo (ANP), a exploração e a explotação de gás de xisto.
A tecnologia atualmente utilizada para a explotação – a fratura hidráulica – tem sido proibida em diversos países onde foram considerados patentes e indiscutíveis os riscos de danos às águas subterrâneas e superficiais. No Brasil, a explotação de gás de xisto, prevista no referido edital, acarretará sérios riscos de contaminação dos aquíferos e pode comprometer os usos humanos nas bacias do rio São Francisco, no Recôncavo Baiano e regiões costeiras de Alagoas e Sergipe, e em regiões do Paraná, Parecis, Paranaíba e Acre-Madre de Dios.
Ademais, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e pela Academia Brasileira de Ciências encaminhou carta à Presidenta, em 5 de agosto último, na qual destaca graves fragilidades técnicas no processo em andamento, tais como:
I. a carência de conhecimento sobre as características petrográficas, estruturais e geomecânicas das rochas consideradas para o cálculo das reservas, o que poderá influir decisivamente na economicidade da explotação; II. o desconhecimento dos impactos negativos da técnica de fratura hidráulica, com a injeção de água e substâncias químicas no subsolo, podendo ocasionar vazamentos e contaminação de aquíferos de água doce fundamentais para o abastecimento de boa parte das cidades brasileiras; III. os grandes volumes de água necessários ao processo de extração, e que retornam à superfície, poluídos por hidrocarbonetos e por outros compostos e metais presentes na rocha e pelos próprios aditivos químicos utilizados, exigem caríssimas técnica de purificação e de descarte dos resíduos finais, podendo comprometer as águas superficiais necessárias ao abastecimento humano e outros importantes usos econômicos; IV. o potencial risco de contaminação das águas do Aquífero Guarani, a maior fonte de água doce de ótima qualidade da América do Sul, que deve ser gerenciada de forma compartilhada pelo Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai.
Tais riscos avultam já que, preliminarmente ao citado leilão, não foram realizadas as seguintes ações:
I. a definição de regras, limites e requisitos mínimos para a atividade de exploração, desenvolvimento e produção de reservatórios de gás não convencional no Brasil, por meio da técnica de fraturamento hidráulico, por parte de Resolução específica da ANP; II. a elaboração das Avaliações Ambientais de Área Sedimentar, instrumento que deve preceder a contratação de atividades de exploração e explotação de petróleo e gás natural; nos termos da Portaria Interministerial MMA/MME Nº198, de 5/04/2012; III. a compatibilização nos Planos de Recursos Hídricos das Bacias Hidrográficas entre o uso da água para a referida explotação com os demais usos, conforme estabelece Política Nacional para as nossas águas (Lei 9.433, de 08/01/97). É indispensável, preliminarmente, conhecer, avaliar e minimizar os riscos ambientais, em especial os que se constituem em séria ameaça à qualidade das nossas águas subterrâneas e superficiais e que podem colocar em risco o abastecimento de água de populações urbanas e rurais e a disponibilidade de água para as atividades agropecuárias.
Assim, além da retirada da exploração e da explotação de gás de xisto do Edital da 12ª Rodada de Licitações da ANP, as entidades subscritoras sugerem à Presidenta da República que determine ao Ministério de Minas e Energia, ao Conselho Nacional de Políticas Energéticas, à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, ao Ministério da Ciência e Tecnologia e suas instituições de ciência e tecnologia, ao Ministério do Meio Ambiente, à Agência Nacional de Águas, que promovam a realização de programa de estudos que ofereça melhor conhecimento, tanto sobre as propriedades das jazidas e das condições de sua exploração, quanto dos impactos ambientais associados.
Atenciosamente
Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES)
Dante Ragazzi Pauli, Presidente Nacional Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (ASSEMAE)
Silvio Marques, Presidente Nacional Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (AESBE)
José Carlos Barbosa, Diretor Presidente Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (ABCON)
Paulo Roberto de Oliveira, Presidente Associação de Servidores da Agência Nacional de Águas (ASAGUAS)
Helvécio Mafra, Presidente Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET)
Sílvio Sinedino, Presidente Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF)
Anivaldo de Miranda Pinto, Presidente Federação Nacional dos Urbanitários (FNU)
Franklin Moreira Gonçalves, Presidente (Segue)
Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (FISENGE)
Carlos Roberto Bittencourt, Presidente Federação Única dos Petroleiros (FUP)
João Antônio de Morais, Coordenador Geral Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas
Affonso Henrique de Albuquerque Junior, Coordenador Geral Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
Gilberto Carlos Cervinski, membro da Coordenação Nacional Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo
Itamar Sanchez, Coordenador
*Imagem: greensefa/ Flickr