Boletim produzido pela FASE aponta potências e contradições do bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. O informativo questiona o modelo de desenvolvimento adotado pelos países.
Os BRICS abrigam 43% da população mundial. A soma dos territórios de seus países ocupa um quarto da área do planeta. Enquanto o Produto Interno Bruto (PIB) do bloco vêm crescendo e ganhando peso no mundo, a distribuição de riqueza, a promoção de equidade e a garantia de direitos econômicos, sociais, ambientais e culturais não crescem no mesmo ritmo. No Brasil, apesar de o país se destacar por sua recente desconcentração de renda, os 20% mais ricos seguem detendo quase 59% da renda nacional. O índice sobe para 68% quando se trata da África do Sul. Na Índia, cerca de 70% da população vive com menos de US$2 por dia. A China, tão reconhecida pelo seu acelerado crescimento, investe apenas 2,8% do seu PIB na educação. Já a Rússia, ainda que nos últimos 10 anos tenha diminuído essa dependência pela metade, cerca de 20% do seu PIB ainda vem da renda obtida com a extração de produtos naturais. Esses são apenas alguns dos dados do informativo “BRICS: Desafios para enfrentar as desigualdades e alcançar a Justiça Ambiental”, produzido pela FASE.
Fátima Melo, organizadora do encarte, destaca que os BRICS são a iniciativa mais concreta já criada com vistas à democratização das instituições internacionais e do processo decisório global, em que as potências tradicionais, como os Estados Unidos e países europeus, continuam tendo amplo poder. No entanto, já no texto de apresentação da publicação, ela reforça: “Os BRICS estão visceralmente ligados à dinâmica do capitalismo global, e o modelo de desenvolvimento por eles adotado produz fortes desigualdades sociais e injustiças ambientais no interior de seus países membros”. Nesse contexto, “são frequentes os conflitos e injustiças sociais e ambientais resultantes da exploração intensiva dos recursos naturais e, em alguns destes países, as violações de direitos e condições de trabalho precárias e degradantes são um padrão”.
Fátima, que é assessora da FASE, explica que a inserção do bloco nas cadeias globais de produção se dá como fornecedores de matéria-prima e de manufaturas baratas. Quando o assunto é o comércio no interior do bloco, Brasil, Rússia, Índia e África do Sul, cada vez mais, exportam para a China produtos primários intensivos em exploração de recursos naturais, como soja, minérios e pedras preciosas. Enquanto isso, o chamado “gigante asiático” comercializa produtos de aço e de ferro, vestimentas e acessórios, elétricos e mecânicos, entre outros.
Emissão de gases do efeito estufa
Os BRICS já respondem por cerca de um terço das emissões globais de gases de efeito estufa, com maior responsabilidade para a China. Ela sozinha soma 22% do total de gases emitidos pelo bloco. Isso corresponde a 26 vezes mais que o emitido pela África do Sul (0,84%), quase sete vezes mais que o Brasil (3,2%), e cerca de quatro vezes mais que a Rússia (5%) e a Índia (5,4%). Porém, Fátima faz a ressalva: as potências tradicionais mantêm os altos padrões de emissões.
Por isso, diante do imenso peso das responsabilidades históricas e dos altos níveis de emissões atuais produzidos por países do hemisfério Norte, a assessora da FASE reforça que o princípio que assegura uma justa diferenciação de responsabilidades entre os emissores deve continuar sendo um pilar central das negociações para a construção de um novo acordo global na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP 21), a ser realizada no final do ano na França.
Além de dar destaque às questões climáticas e às matrizes energéticas dos países do bloco, ainda tão dependentes de bens naturais, como carvão, petróleo e gás natural, a publicação traz informações em relação a diversas áreas: emprego, comércio e investimentos, saúde, educação, etc. Também disponível em inglês, inclui mais de 30 gráficos e tabelas, utilizando fontes como a Agência Internacional de Energia, Banco de Dados do Banco Mundial, Word Resources Institute (WRI), dentre outras.
Desafios para organizações e movimentos sociais
Em todos os países do bloco já ocorrem lutas de resistência por direitos e contra as desigualdades, envolvendo organizações, movimentos sociais e populações atingidas pela exploração de minérios e projetos energéticos, por exemplo. Porém, Fátima analisa que essas lutas, mesmo que intensas, ainda não conseguem fazer com que a arquitetura institucional dos BRICS inclua a participação social. Diante disso, a ideia do encarte foi contribuir para a ampliação do debate sobre os rumos dos BRICS junto à sociedade.
Nesse sentido, a publicação chama atenção para os desafios de organizações e movimentos sociais, como o de “reunir elementos para a construção de saídas distintas ao modelo de desenvolvimento implantado pelos BRICS, cujas bases sejam a justiça ambiental e social, combinada com a articulação contra-hegemônica de países do Sul, fortemente ancorados em suas respectivas regiões. Para tal é necessário que as organizações e movimentos sociais e demais forças populares nos países membros disputem a destinação dos investimentos e trocas comerciais dos BRICS a favor de seus direitos”.
Acesse e baixe a publicação em português e em inglês. Se tiver interesse nas versões impressas, entre em contato com a FASE pelo correio eletrônico comunicacao@fase.org.br.